Mais 12 pessoas são resgatadas de trabalho análogo ao escravo no Sertão da PB e RN

Flagrante ocorreu após inspeção em minas de extração de caulim nos municípios de Junco do Seridó, Tenório e Equador

João Pessoa, 11/06/2019 - Menos de um mês após retirar 12 trabalhadores em condições análogas às de escravo de uma mina de caulim, no Município de Salgadinho, Sertão da Paraíba, mais 12 trabalhadores foram resgatados em situação semelhante. Desta vez, as diligências ocorreram em minas de caulim nos municípios de Junco do Seridó e Tenório, na Paraíba, e no Equador, no Rio Grande do Norte, durante operação do Grupo Especial de Fiscalização Móvel que começou na última quinta-feira (6).

Outros 21 trabalhadores também foram resgatados em operação ocorrida no mês passado, em fazendas no Maranhão e Roraima, totalizando assim 45 resgates em quatro estados.

A operação é do Grupo Especial de Fiscalização Móvel, composta por membros do Ministério Público do Trabalho (MPT) e da Defensoria Pública da União, além de auditores-fiscais do Trabalho, do Ministério da Economia. No MPT, a investigação está sendo conduzida pelo procurador Eduardo Varandas Araruna, coordenador regional de Erradicação do Trabalho Escravo (Conaete). Agentes da Polícia Rodoviária Federal também foram requisitados para essa ação conjunta.

“Homens-tatus”: acidentes e mortes nas minas de caulim

“Nós encontramos trabalhadores de 25 anos até, mais ou menos, 50 anos de idade. Todos ganhavam menos de um salário mínimo, apesar de um trabalho extremamente degradante, que a gente define como ‘trabalho em confinamento’ e a situação precária com que desciam nas minas de 30 a 40 metros de profundidade, em um buraco extremamente estreito, tanto que são chamados de ‘homens-tatus’. Alguns nos relataram, inclusive, que trabalhadores já morreram nessas minas”, detalhou o procurador Eduardo Varandas.

Varandas acrescentou que “o caulim é comprado por grandes empresas que fabricam cerâmicas”, amplamente utilizadas para a produção de pisos e de azulejos. “O problema é que a média salarial desses trabalhadores chega a R$ 400, no máximo, R$ 600 por mês. Isso é extremamente barato e se equipara, pelo código penal, a atividade análoga à escravidão”, lembrou.

Pés descalços, sem equipamentos, sem proteção

“O que mais nos causa uma certa tristeza é que os trabalhadores estavam trabalhando de pés descalços, sem capacete, sem segurança alguma. A estrutura que os leva às profundidades é extremamente artesanal, arcaica, podendo haver ruptura da corda sem qualquer Equipamento de Proteção Individual (EPI)”, descreveu Eduardo Varandas.

Saúde dos trabalhadores

O procurador do Trabalho Eduardo Varandas explicou que são muitos os relatos de problemas de saúde que esses trabalhadores desenvolvem. “São doenças respiratórias como a silicose, câncer de pele por exposição excessiva ao sol sem proteção, bem como acidentes do trabalho, sendo alguns fatais”, disse.

Legislação

De acordo com Varandas, a legislação impõe uma série de medidas protetivas para evitar danos à saúde desses trabalhadores, tais como capacetes, luvas, máscaras, treinamento para trabalhar com a extração do caulim, providências com o maquinário. “Nada disso vinha sendo obedecido e os trabalhadores laboravam descalços, em banquetas improvisadas, com pouca iluminação e muito calor, sem nenhuma observância às regras de saúde e segurança no trabalho, convivendo com o risco iminente de soterramento e morte”, disse.

Penalidades

“As penalidades vão desde as multas administrativas aplicadas por auditores do Trabalho, além de o empregador responder pelo crime de redução à condição análoga à de escravo (CP, art. 149, caput) com pena de reclusão de até oito anos”, informou o procurador Eduardo Varandas.

Operação

Segundo Eduardo Varandas, a operação ainda está em andamento. “As inspeções nas pedreiras já encerraram. Nesse momento, estamos acompanhando o pagamento dos direitos trabalhistas das vítimas, inclusive com ressarcimento de dano moral individual”, informou o procurador, direto de Caicó (RN).

“A próxima etapa será verificar quais empresas de grande porte consomem o produto objeto do trabalho escravo para responsabilizá-las, já que elas alimentam a cadeia produtiva da escravidão”, afirmou Varandas. “Esta última etapa caberá ao MPT exclusivamente investigar em inquérito civil”, acrescentou.

Dano moral

“As rescisões individuais dos resgatados com o dano moral implicará valores de até R$ 8 mil por trabalhador, já que o período era bastante curto. Em média, os trabalhadores – devido à rotatividade da mão de obra e à precarização – estavam há dois meses em cada empresa, o que não significa que eles só tenham trabalhado esse tempo na extração do caulim. Encontramos trabalhadores que laboram há mais de 10 anos nessa atividade”, concluiu o procurador Eduardo Varandas.

Caulim: o minério branco

Além da produção de cerâmicas, o mineral branco caulim é bastante usado na fabricação de papel, na indústria de borracha, plásticos, pesticidas, rações, produtos farmacêuticos, cosméticos, entre outros.

Escravidão contemporânea

Atualmente, no Brasil, quatro elementos definem a chamada “escravidão contemporânea”: trabalho forçado (que envolve cerceamento do direito de ir e vir), servidão por dívida (um cativeiro atrelado a dívidas, muitas vezes fraudulentas), condições degradantes (trabalho que nega a dignidade humana, colocando em risco a saúde e a vida do trabalhador) ou jornada exaustiva (levar o trabalhador ao completo esgotamento dada a intensidade da exploração, também colocando em risco sua saúde e vida).

Fonte: Ministério Público do Trabalho na Paraíba
Informações: (83) 3612-3119
www.prt13.mpt.mp.br | facebook: @MPTPB | instagram: @MPTPARAIBA

Tags: trabalho escravo, Ministério Público do Trabalho, Coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo , verbas rescisórias, resgate, proteção dos trabalhadores

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